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Por que a diversidade incomoda?

O caso da publicidade do Banco do Brasil vetada

pelo Governo Federal

19 de junho de 2019

Em abril desse ano, um anúncio publicitário do Banco do Brasil foi vetado pelo Governo Federal, sócio majoritário da empresa que funciona como economia mista. O VT produzido para uma de suas tradicionais campanhas institucionais, que tem exatos 31 segundos e é marcado pela diversidade, parece ter desagradado a alta cúpula do governo.

Nos dias de auge da polêmica, correu pela mídia a notícia de que o presidente teria se encarregado pessoalmente da proibição taxativa de sua veiculação, que já estava em andamento, ordenando, ainda, que a partir daquele momento todas as peças publicitárias de empresas ligadas ao governo passassem pela aprovação da Secretaria de Comunicação Social (Secom), fosse a campanha institucional ou mercadológica, ANTES de serem veiculadas. Algo que foi revisto pouco depois, segundo informa matéria publicada no site da revista Meio & Mensagem.

O candidato que foi eleito a partir de um discurso fortemente “anti-ideológico” sedimentou, então, uma avaliação eminentemente ideológica para aprovar ou não o que seria promovido pelas empresas ao seu alcance, incorrendo em uma ilegalidade por ferir a chamada Lei das Estatais. O fato gerou um imenso desconforto, ocasionando, inclusive, a demissão do diretor de marketing da instituição, Delano Valentim.

Na intenção de não propagar o que, em sua interpretação, seria uma “propaganda ideológica”, o que de fato fez foi impulsionar o vídeo, que não traz nada de excepcional, diga-se de passagem. Desde então, o material publicitário que, em outras circunstâncias talvez nem chamasse tanta atenção, passou a ser tratado como um símbolo de resistência e representatividade por todos os cantos da internet. A contragosto, o governo não somente impulsionou o comercial como também se alçou ao posto de principal garoto-propaganda da campanha.

O VT não traz nada de extravagante ou fora do comum. Mostra pessoas diversas, em sua maioria jovens, que provavelmente seria o recorte a ser alcançado pela produção. Quem faz parte ou convive com esse público bem sabe: jovens costumam, sim, se comunicar dessa forma, com gírias das mais variadas. 'Faz carão', 'capricha na selfie', e tantas outras falas mencionadas no anúncio, são frequentes na linguagem digital da juventude que inunda aplicativos de mensagens e plataformas de redes sociais. É o famoso “estilo lacração”, que parece ter sido exatamente o que incomodou.

A “olhos nus”, o principal garoto-propaganda da peça, inclusive, passaria despercebido. Poucos fora do contexto digital podem ter reconhecido ali a presença de Rafael Lange, conhecido como Cellbit, youtuber com mais de 6 milhões de inscritos em seu canal.

São alguns pequenos sinais que vão demonstrando a quem a peça publicitária pretendia alcançar e evidenciando o quão o seu veto foi inoportuno. Afinal, tal publicidade não alcançaria seu público? Se não, por quais motivos? Deporia contra a identidade construída pela marca do Banco do Brasil?

Ao que parece, o que causou espanto foi, justamente, o receio do “diferente”. O que está implícito na reprovação dessa peça publicitária é a tentativa de negar a diferença. O que é lamentável, pois, como ressalta Stuart Hall em seu clássico ‘Cultura e Representação’, a capacidade de viver com a diferença e a necessidade de reivindicar sua representatividade de forma positiva na mídia é um assunto premente do século XXI.

Sobre esse caso, é interessante ainda observar como o próprio mercado publicitário se aproveitou da ocasião e da mídia espontânea gerada a partir do equívoco do Governo Federal. O Banco Bradesco, por exemplo, lançou semanas depois uma campanha com a mesma tônica. Confira aqui. O Burger King Brasil também se posicionou, estampando em seus anúncios a chamada de elenco para seu novo comercial priorizando pessoas que tenham participado de um comercial de banco que tenha sido vetado e censurado nas últimas semanas. Confira aqui.

Em um contexto político de constantes disputas narrativas, é necessário entender que qualquer deslize pode - e será - utilizado em favor de alguém. Nesse caso, ganha o mercado, que fica recheado de pautas. Perde a representatividade.


Texto escrito por Thiago Toledo, mestrando em Comunicação no PPGCOM-UFMT, integrante do OPSlab.